31 outubro, 2013
Noite Varada
Escutávamos juntos o canto dos primeiros sabiás, noite varada, olhos exaustos, água da pena e uns bons cigarros. Aos que se entregavam ao sono, distribuíamos cobertas, colchas, travesseiros, almofadas, o que fosse. Ajeita-se qualquer pessoa quando esta dorme por cansaço físico. Tarefa mais fácil ainda quando a parada é etílica. Nenhuma alma, mesmo que perturbada, resiste ao sono do porre. Até porque, dormir é morrer um pouco, o adeus tão esperado, descansar. Mas o canto dos sabiás... Me lembrava o Tom, “vou voltar, sei que ainda vou, vou voltar para o meu lugar...”, e uma angústia absurda me rasgava, tinha a noção da fome no mundo, um saudade de casa, uma vontade de regresso. Mas pra onde eu vou voltar? Eu, que não tinha lugar. “Para onde estamos indo?”, eu indagava, com os olhos marejados. “Estamos indo sempre pra casa”, disse ele, com a voz baixa e mansa, apagando o último cigarro, bebendo o último gole d’água, e me dizendo adeus, pela última vez.
30 outubro, 2013
Meu Espelho
Não temo o futuro
Esconderijo secreto
Do que já está aqui
Pois no instante que virá
Nada existe se não o que não há
Não sofro o passado
Deixo que meus mortos
Durmam e descansem
Esqueço, no mais,
Até das flores e das pedras
Mas esse instante que passa
É meu martírio e meu alento
Esse é lugar onde vivo
O presente é o espelho
Do meu tempo de viver
15 outubro, 2013
Há vagas
Em dias assim, minha alma transita
entre o mundo e o mundano
entre o real e o insano
Buscando alguns sortilejos
E nesta esfera mitológica
Imponho minhas paixões
Empenho as ilusões
Às varejeiras ponteadas: a vida
Às matadeiras de combate: a morte
Excepciono-me: há vagas
10 outubro, 2013
Do Prazer de Primaverar-se
Desprender-se
Desaprender-se
Desapegar-se
Perseguir-se
Persistir-se
Permitir-se
Ser a folha
Ramificar-se
Ser a raiz
Florecer-se
Esgueirar-se
Entre as trevas
Perceber-se
E depois aproveitar
E gozar
E relaxar
Já chegou a primavera
Já é tempo de amar!
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